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União Europeia adota estratégia calculada contra tarifas de Trump enquanto mercados globais desabam

União Europeia adota estratégia calculada contra tarifas de Trump enquanto mercados globais desabam

Bloco europeu opta por resposta medida às tarifas comerciais americanas, evitando retaliação imediata e explorando seu poder como maior bloco comercial do mundo.

A União Europeia se encontra em posição estratégica incomum após a imposição das novas tarifas comerciais pelo governo Trump. Enquanto o primeiro-ministro da Eslováquia, Robert Fico, foi repreendido por tentar negociações bilaterais sobre comércio com os EUA — violando a regra fundamental de que o bloco "fala com uma só voz" — Bruxelas agora prepara uma resposta coordenada que poderá definir o novo cenário do comércio internacional.

As tarifas americanas implementadas em 9 de abril atingem a UE com taxa de 20%, consideravelmente menor que os 104% impostos à China ou os 46% ao Vietnã. Esta diferenciação, entretanto, não impediu que os mercados globais reagissem negativamente, sinalizando que a própria queda das bolsas já pode representar uma retaliação natural à agenda protecionista de Trump.

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A Europa mantém uma vantagem significativa neste embate: ao contrário dos EUA, continua negociando com o resto do mundo nos mesmos termos de antes, o que limitará substancialmente os danos econômicos às suas empresas e à sua economia.

"É uma questão de reatribuir recursos e mercados", afirmou Alvaro Muñoz, CEO da AMFRESH, grande produtor espanhol de produtos frescos, evidenciando a visão pragmática que prevalece entre o empresariado europeu.

A burocracia europeia, frequentemente criticada, agora se apresenta como um ativo valioso, prometendo estabilidade em meio à turbulência causada pela agenda comercial americana. Enquanto investidores temem uma possível recessão global, o bloco europeu evita a implementação precipitada de contra-tarifas agressivas que apenas agravaria o cenário econômico mundial.

Unidade europeia contra o protecionismo

O discurso dos líderes europeus tem se mantido notavelmente consistente. Emmanuel Macron, presidente francês, declarou logo após o anúncio americano: "Nada pode ser descartado, todos os instrumentos estão na mesa." Na mesma linha, o primeiro-ministro espanhol Pedro Sánchez reforçou que "a UE reagirá com proporcionalidade, unidade e a força que advém de ser o maior bloco comercial do mundo".

A primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, prepara uma visita à Casa Branca para negociar em nome do bloco europeu, reforçando a mensagem coletiva contra as medidas protecionistas.

Ironicamente, Trump perdeu a oportunidade de semear discórdia entre os membros do bloco ao aplicar tarifas uniformes à UE. Caso tivesse imposto taxas diferentes para países específicos, poderia ter gerado conflitos internos significativos entre as nações europeias.

A manutenção da unidade europeia, no entanto, enfrenta desafios. Macron recebeu grandes industriais e exportadores no Palácio Elysée para exortá-los a suspender investimentos na América, medida que não foi unanimemente bem recebida. Autoridades alemãs temem que empresas europeias possam fazer lobby por favores em Washington, minando a resposta coletiva do bloco.

Estratégia tríplice europeia

A resposta da Europa provavelmente combinará três elementos fundamentais. Primeiro, uma demonstração de força, possivelmente utilizando o Instrumento Anti-Coerção (ACI), ferramenta que permite ao bloco implementar uma ampla gama de medidas além de tarifas para revidar países que exercem pressão econômica sobre seus membros.

O segundo elemento consiste na intensificação gradual das ameaças tarifárias como forma de pressionar por negociações. Em 7 de abril, o bloco apresentou sua lista inicial de tarifas para combater as medidas americanas sobre produtos metálicos, mas decidiu contrariar uma quantidade menor de exportações americanas, sinalizando que não deseja uma guerra comercial total.

O terceiro pilar da estratégia europeia envolve o apoio direto às empresas afetadas. A Espanha já apresentou um plano de €14 bilhões, incluindo €5 bilhões em garantias de crédito para empresas com problemas de liquidez devido a pedidos perdidos. Outros países europeus devem implementar medidas semelhantes, enquanto o Banco Central Europeu pode anunciar um corte de taxa mais agressivo para aliviar o clima econômico sombrio.

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Oportunidade perdida para o livre comércio

A União Europeia tem agora uma oportunidade única de renunciar ao protecionismo e se tornar o principal defensor global do livre comércio. Infelizmente, os sinais apontam que o bloco não aproveitará plenamente esta chance.

Em vez de abrir seus mercados, a Europa planeja erguer barreiras adicionais para impedir que a superprodução global se espalhe em suas costas à medida que o mercado americano se fecha. A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, deixou isso claro em conversa com o primeiro-ministro chinês, Li Qiang.

Este seria o momento ideal para reduzir as tarifas sobre importações agrícolas, mas tal medida sequer está sendo discutida. A França reconsiderando o acordo entre a UE e o Mercosul, bloco comercial da América do Sul, representa um passo tímido comparado ao potencial de movimentos mais ousados, como uma possível adesão ao CPTPP, o acordo comercial asiático que sucedeu à Parceria Transpacífico após a saída americana.

Com a ordem global e a segurança europeia em jogo, esta guerra comercial representa muito mais que simples tarifas. As ambições europeias podem incluir objetivos políticos mais amplos, como sugerido por um funcionário de Bruxelas: "O que é preciso para os republicanos abandonarem Trump, ou para o partido perder mal as duas casas no meio do período? E isso vale uma recessão na Europa? A resposta é provavelmente sim."

A postura calculada da Europa evidencia não apenas uma estratégia comercial, mas também um cálculo político sobre o futuro das relações transatlânticas em um cenário de crescente protecionismo global.

Eduardo Suárez

Eduardo Suárez

Eduardo é jornalista e comentarista político, com uma visão crítica sobre os eventos que impactam a política, a economia e as questões sociais. Suas colunas provocam reflexões e convidam seus leitores a questionar o status quo.